Com o lançamento de Avowed, a Obsidian Entertainment não apenas expande o universo de Pillars of Eternity, mas também redefine como um RPG de fantasia pode funcionar em primeira pessoa. A missão era ousada: transformar um mundo tradicionalmente visto de cima — com foco tático e combates por turnos — em uma experiência imersiva e direta, cheia de impactos visuais e sensação de peso a cada golpe. Neste artigo, vamos destrinchar como isso foi feito, desde as decisões de animação até os bugs mais insanos que surgiram durante o desenvolvimento.
Um novo olhar sobre um velho mundo
Pillars of Eternity conquistou fãs com sua perspectiva isométrica e narrativa rica. Já Avowed leva esse mundo para outra direção, adotando uma visão em primeira pessoa e apostando em combates mais próximos, físicos e viscerais. Isso não é algo novo para a Obsidian, que já trabalhou com títulos como Fallout: New Vegas e The Outer Worlds, mas agora o desafio era converter um universo inteiro pensado para outro estilo.
E, claro, toda comparação com Skyrim era inevitável — o “gorila de 800 quilos” do gênero, como brincam os próprios desenvolvedores.
O que torna o combate de Avowed tão especial?
O segredo está nos detalhes: hit stops, animações em 60 FPS, efeitos de arrasto (motion trails), resposta visual a impactos e animações específicas dependendo do tipo de ataque. Segundo os diretores Gabe Paramo (gameplay), Ash Kumar (efeitos visuais) e Seth McCaughey (animação), foi essa combinação que deu ao combate o “peso” necessário para torná-lo memorável.
Principais técnicas usadas:
- Hit Stops: pausas breves no momento do impacto que simulam o choque de objetos.
- Motion Trails: rastros sutis deixados por armas em movimento, melhorando a legibilidade dos golpes.
- Animações com 60 FPS: suavidade e fluidez mesmo em lutas intensas.
- Transições específicas: golpes que batem em armaduras mais fortes fazem a arma “ricochetear” em vez de atravessar.
Esses elementos juntos garantem que o jogador sinta a diferença entre golpear o ar e acertar um inimigo de verdade — algo que faltava em The Outer Worlds, por exemplo.
O multiplayer que não veio, mas mudou tudo
Inicialmente, Avowed teria modo cooperativo. A ideia foi abandonada em 2023, pois atrapalhava a fluidez do single-player. No entanto, as fundações técnicas criadas para suportar multiplayer — como a sincronização entre perspectivas em primeira e terceira pessoa — acabaram beneficiando todo o sistema de combate.
Segundo Paramo, o uso de montagens com “slots” no Unreal Engine permitiu manter duas animações rodando ao mesmo tempo (primeira e terceira pessoa), garantindo consistência para jogadores que preferem alternar a câmera ou têm sensibilidade a movimentos em FPS.
Esse sistema também facilitou a criação de uma câmera em terceira pessoa funcional, que agora é parte essencial da experiência.
Magia e efeitos visuais sob medida
Feitiços e armas mágicas em Avowed não são apenas enfeites. Como o jogador está imerso na cena, tudo acontece diante dos seus olhos: faíscas, correntes elétricas, bolas de fogo. E tudo isso com um cuidado visual enorme.
Ash Kumar destacou que, em vez de tratar efeitos como “paisagem de fundo”, foi necessário ajustar cada um para não ofuscar a tela, sem perder brilho ou impacto. Os efeitos também mudam entre primeira e terceira pessoa, respeitando a perspectiva do jogador. Até o sangue — sim, ele também teve ajustes específicos dependendo do ângulo.
Animações que respondem ao jogador
Seth McCaughey explicou que muitas animações não são lineares. Ao acertar um inimigo, a arma pode atravessar, ser bloqueada ou até vibrar com o impacto. Cada uma dessas situações exige uma animação diferente — algo que adiciona realismo e diversidade ao combate.
Além disso, os inimigos mais resistentes ativam reações visuais distintas. A arma “salta” ao bater em algo mais duro, sinalizando ao jogador que aquele oponente exige mais estratégia ou poder.
Aprendendo com o público
Após o primeiro trailer exibido na Xbox Showcase de janeiro de 2023, a Obsidian recebeu críticas sobre a sensação dos combates. A equipe usou esse feedback como referência para ajustar os movimentos, os tempos de resposta e os efeitos visuais. Foi um “norte” para comparar o que funcionava e o que não funcionava.
Essa abordagem não é possível para todos os estúdios, mas funciona como modelo para quem lança jogos em acesso antecipado ou faz betas fechados: deixar o público ajudar a calibrar a experiência final.
Bugs engraçados que marcaram o processo
Claro, nada disso acontece sem imprevistos. A equipe compartilhou alguns bugs hilários:
- Espada gigante: inimigos que, do nada, empunhavam armas três vezes maiores que eles.
- Armas invisíveis atravessando o corpo: especialmente em NPCs acusados de covardia.
- “Mouse Door”: ratinhos com IA humana que abriam portas como se fossem cidadãos da cidade.
Esses erros, apesar de complicados, viraram momentos de humor entre os desenvolvedores e mostram a complexidade por trás da construção de um mundo interativo tão vivo.